Incêndio no Museu Nacional é reflexo do abandono das instituições de Educação e Cultura brasileiras

Quem conheceu de perto o Museu Nacional agora terá de guardar as lembranças na memória afetiva. Noventa por cento do acervo de 20 milhões de peças foi consumido nas chamas que destruíram, neste domingo, a mais antiga instituição científica da história do país.

O incêndio começou por volta de 19h30, quando o prédio histórico, na Quinta da Boa Vista, zona norte do Rio de Janeiro, já havia sido fechado para o público. Não houve vítimas fatais, nem feridos. A tragédia, no entanto, provocou um sentimento de dor e perplexidade em grande parte da população. Hoje pela manhã, foi o momento de ver o que restou. Historiadores, museólogos, arqueólogos e amantes da cultura pareciam não acreditar no que estava acontecendo. “As pessoas sentam, choram, se abraçam… É o velório de um amigo querido…. e a minha vontade é ficar pra sempre aqui por ele… mas meu coração não aguenta mais tanta tristeza”, relatou a jornalista Cristina Barcia.

Ainda não há pistas do que pode ter iniciado as chamas. Segundo o Corpo de Bombeiros, o trabalho foi dificultado porque os hidrantes do museu estavam descarregados e foi necessário pedir o apoio de carros-pipa. Alguns pavimentos internos do prédio desabaram, mas os bombeiros conseguiram retirar uma parte do acervo antes.

 

História da família real 

O Museu foi criado por D. João VI e completou 200 anos em 2018. O edifício, que foi residência da família Real e Imperial brasileira, é tombado pelo patrimônio histórico. Sua estrutura é de madeira, o que permitiu que as chamas se espalhassem com mais rapidez. O prédio também sofria com a falta de manutenção, como cupins, infiltrações e falhas no reboco.

Entre as raridades do Museu, destacam-se a coleção egípcia, que começou a ser adquirida pelo imperador Dom Pedro I; o mais antigo fóssil humano já encontrado no país, batizado de \”Luzia\”, com cerca de 11 mil anos; um diário da Imperatriz Leopoldina; um trono do Reino de Daomé, dado ao Príncipe Regente D. João VI, em 1811; o maior e mais importante acervo indígena e uma das bibliotecas de antropologia mais ricas do país.

A instituição, ligada à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), vinha sofrendo com os cortes orçamentários há pelo menos três anos. Muitos pesquisadores, alunos e professores creditam a tragédia ao corte de custos.

Para o diretor da instituição, Alexandre Kellner, 200 anos de memória, ciência, cultura e educação se perderam por falta de suporte e consciência da classe política brasileira. “Meu sentimento é de imensa raiva por tudo o que lutamos e que foi perdido na vala comum\”, ressaltou. O diretor contou, em entrevista à imprensa, que no aniversário de 200 anos da instituição nenhum ministro de Estado aceitou participar da comemoração. \”É uma pequena mostra do descaso\”, disse ele, que afirmou que a instituição estava fechando uma negociação com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que incluía, justamente, um projeto de prevenção de incêndios.

O ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão, afirmou em entrevista à GloboNews que o ocorrido é parte do processo de negligência de anos anteriores. “Que isso sirva de alerta para que não aconteça em outros museus. Medidas que poderiam ter sido tomadas anteriormente não foram tomadas\”, destacou ele, que disse que foi feito um projeto para a revitalização do prédio e os recursos foram levantados, \”mas não deu tempo de evitar a tragédia\”.

 

É preciso cobrar ações concretas 

O incêndio pode ter sido consequência do descaso, da negligência e da irresponsabilidade do poder público. Mas agora, mais importante do que apontar culpados, é cobrar das autoridades a reconstrução do que for possível no Museu e ações concretas para que novas tragédias como essa não aconteçam.

“Nossas instituições de Educação e Cultura estão abandonadas, destituídas de importância! O incêndio do Museu Nacional é simbólico”, desabafa a jornalista Katy Navarro.

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