Uma história é capaz de tocar o coração e fazer a diferença na vida de alguém, seja ela uma criança, um adolescente ou um adulto. Esse foi o desejo de Anete Lacerda ao escrever “E se fosse você?”.
O livro de estreia da jornalista e especialista em Gestão Estratégica de Comunicação e Marketing, aborda o racismo e a gordofobia de maneira lúcida.
“E se fosse você?” conta a história de Lili, uma criança de 6 anos, alegre e que adora brincar com os irmãos, Caio e Ana, de 4 e 2 anos, respectivamente.
No entanto, seu comportamento muda quando eles passam a frequentar uma nova escola e Lili começa a sofrer bullying por ser negra e gordinha.
Percebendo a tristeza e a mudança no comportamento da filha, Marina vai até a escola e, ao lado de professores, passa a realizar projetos e reuniões de conscientização com os pais e alunos sobre a gravidade do racismo e da gordofobia.
Atualmente, o racismo tem sido muito discutido e o movimento “Vidas Negras Importam” (Black Lives Matter) ganha cada vez mais destaque. Isso nos faz lembrar que devemos ensinar as crianças a não terem preconceitos e lutarem para que o racismo acabe e não seja naturalizado.
Com a história, percebemos mais uma vez que ninguém nasce racista ou preconceituoso. As crianças repetem o que aprendem com os responsáveis. Além disso, o livro também passa outros grandes ensinamentos, mas não vamos dar spoilers, né?!
Quem é Anete Lacerda?
Conhecemos a obra e devemos conhecer a mente por trás de tudo isso. Apesar de escrever diversos textos, Anete Lacerda nunca havia pensado em escrever um livro, o que só aconteceu devido à motivação de amigos.
“Não pensava em fazer um livro, principalmente no segmento infantojuvenil e paradidático. Sou uma pessoa tímida, e talvez por força do hábito da profissão, aprendi a ouvir mais do que falar”, afirma.
Alguns amigos sempre comentavam que suas crônicas, apesar de serem simples, tocavam o coração. Além disso, ela recebia mensagens de pessoas desconhecidas comentando que tudo que precisavam naquele dia, tinham lido em seu texto.
A autora, mãe de duas filhas, revela que mesmo assim não levava a história de publicar um livro muito a sério, pois escreve de forma despretensiosa, sem a ansiedade ou necessidade de posar de escritora.
“O diferencial foi o convite de Isa Colli num momento em que estava de repouso por causa de um acidente de trabalho e quase entrando em depressão. Ela me provocou a escrever e tentei, muito insegura em relação a conseguir falar numa linguagem que fosse acessível a crianças e adultos”, conta.
O processo de escrita e a história
Os temas abordados no livro foram escolhidos pensando em algumas situações que Anete presenciou e enfrentou. Convivendo com os primos negros, a autora viu muitas situações de racismo que só foi perceber como tóxicas e excludentes muito tempo depois.
Em relação a gordofobia, a autora revela que como sempre teve mais peso que as colegas, acabou enfrentando piadas de mau gosto que eram dolorosas.
“Talvez isso tenha contribuído para a abordagem desses temas. Para mim, racismo e gordofobia ferem, discriminam, excluem e provocam dor em qualquer fase da vida”, conta.
A autora acredita que abordar os temas com crianças pode contribuir para quebrar o ciclo de violência e assédio moral.
“E se fosse você?” foi escrito em 15 dias, após várias revisões e edições. Segundo Anete, ela ia tirando muitas coisas e colocando outras.
“Foi um processo de muita insegurança. Mas pensava que se a história de Lili ajudasse uma criança a se empoderar e outra a mudar de hábito, já teria valido a pena”, afirma.
Ilustrações
Além da escrita, algo que faz toda a diferença em um livro voltado para os pequenos são as ilustrações. A tarefa de ilustrar “E se fosse você?” ficaram por conta de Fernando Hugo Fernandes.
Para a autora, as ilustrações valorizam o livro e também são responsáveis pelo sucesso da obra.
“Fernando é muito talentoso e ilustrou lindamente a história. Fiquei realmente encantada com as ilustrações”, afirma.
A representatividade
Como já mencionado acima, “E se fosse você?” transmite a necessidade de se combater o racismo e para Anete, a importância do livro é abordar de formar lúcida um tema que ainda precisa ser debatido em pleno século XXI.
Ela espera que a história de Lili engrosse a fila dos que, a curto e médio prazo, protestam, por entenderem a gravidade do racismo e diminua a fila dos racistas, por enxergarem o quão estupida é essa prática.
“É preciso tocar no assunto. Não dá para naturalizar essa prática ou ignorá-la. As crianças são nossa esperança. Espero de verdade que a história toque o coração de crianças e adultos e faça a diferença”, afirma.
Anete viu o livro pronto pela primeira vez na Bienal do Rio de Janeiro em setembro de 2019, um momento de muita emoção, não só por ser o lançamento de seu primeiro livro, mas também local onde muitas mulheres disseram o quanto se identificaram com a história.
Para a autora, é surpreendente e agradável saber que as pessoas se veem na história.
“Fiquei emocionada ao ver que Lili podia incentivar as pessoas a superarem os traumas causados pelo bullying que sofreram na infância. As mulheres diziam que a história da Lili era a delas e que hoje sabiam que eram tão lindas como ela. Falavam isso com os olhos brilhando de emoção e foi muito gratificante para mim como autora de primeiro livro”, conta.
A identificação
Quem se identificou muito com a história foi Thayná Santos, de 21 anos. Quando criança, sofreu bullying por sua cor e por ser gordinha. Assim como no livro, a vestibulando de medicina teve apoio e suporte da mãe, inclusive, um dos pontos que mais a marcou na história.
“A identificação com a Lili foi na hora, principalmente, da relação entre mãe e filha para vencer tanto o bullying, como o racismo. Algo que me chamou bastante atenção no livro foi a questão de quando ela saia com os irmãos e por eles serem claros e terem o cabelo liso, as pessoas os elogiavam e nunca a Lili, gordinha e do cabelo crespo”, conta.
Thayná revela que foi filha única até os 8 anos, mas passou por episódios assim que marcaram a infância, sua identidade.
“Eu, mais do que ninguém, sei o quanto é importante você ter uma referencia palpável, ter uma inspiração e principalmente ter o auxilio da família para a criança conseguir crescer sem se perder no meio disso tudo”, diz.
Já tem bastante tempo que Thayná passou por situações como a de Lili e, durante esse tempo, ela revela que não via nada que abordasse de forma tão direta, tão acessível o tema como “E se fosse você?”.
“Você não costuma ver negros sendo protagonistas em livros, novelas e outras coisas, a falta de representatividade é algo muito grande e quando é retratado de forma tão explicita assim, eu quero o livro para mim. É o tipo de livro que eu vou ter satisfação em ler para um filho meu”, conclui.
Como adquirir “E se fosse você?”
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