Aprenda a desapegar de objetos desnecessários e a não se tornar um acumulador
Quem nunca guardou em casa objetos que poderiam ser jogados fora ou doados? Pois se você está entre essas pessoas, não se culpe. Guardar coisas importantes ou que tenham algum significado na nossa vida é absolutamente compreensível. Todo mundo faz. O problema é quando você se torna um acumulador, ou seja, não consegue controlar a compulsão por guardar objetos, sejam eles livros, cadernos, jornais velhos, recibos de contas antigas ou brinquedos. Nós ouvimos uma personal organizer e uma psicóloga para dar dicas de como manter um ambiente organizado, afastando o risco da acumulação. O aprendizado também deve ser passado às crianças.
“Se há uma coisa que realmente muda na casa depois de termos filhos é a organização. Muitas brincadeiras acabam deixando inúmeros objetos espalhados por todos os cantos da casa. A importância da organização e limpeza da casa está relacionada ao processo disciplinar da criança. Além disso, participar do processo de arrumação ajudará a criança a manter-se organizada e descobrir o que é realmente importante e útil no decorrer de sua vida”, afirma a personal organizer, Caroline Picone.
Pais devem incentivar os filhos no processo
Caroline conta que a best seller Marie Kondo, autora japonesa do livro “A Mágica da Arrumação”, diz que o processo de organização deve acontecer por categorias e, no momento da triagem dos objetos, devemos decidir o que vamos manter na casa e não o que irá sair da casa. O método utilizado para fazer a seleção é identificar o que lhe traz alegria.
Quando se trata dos pertences das crianças, os pais devem incentivar os filhos no processo, mas a decisão é sempre do responsável pelo objeto.
“Muitos pais exigem que os filhos arrumem os quartos, mas quantos são os pais que realmente são organizados e que já ensinam os filhos a limpar e arrumar? É necessário que a aprendizagem aconteça a partir do exemplo. Demonstrado o entusiasmo nas tarefas de casa, a criança será encorajada a fazer o mesmo”, destaca a profissional, ressaltando que a desordem é causada pelo fato de os objetos não terem um local definido para ficar.
Para ela, é importante que cada coisa tenha o seu lugar e que existam áreas específicas para leitura, lazer, arte, alimentação, vestiário e descanso, entre outros. “Coisas similares devem estar sempre juntas. As coisas de maior utilidade precisam estar mais propensas à mão e, aquilo que se usa menos, nos espaços de mais difícil acesso”, orienta.
Criar rotina ajuda na organização
Para garantir o envolvimento da criança, comece estabelecendo pequenas rotinas que ela consiga começar e terminar. Entre dois e quatro anos de idade, a criança pode guardar os brinquedos, colocar sua roupa no cesto e levar o pratinho para pia. Dos cinco aos sete anos, pode ajudar a organizar seu material escolar na mochila e guardar o pijama, por exemplo. Acima de oito anos, pode ajudar colocar a mesa para almoço ou jantar, levar o lixo para fora e arrumar sua cama. Na pré-adolescência, pode ajudar na limpeza da casa: lavar louça, lavar banheiro, lavar ou estender a roupa lavada, arrumar seu quarto, retirar o lixo, ajudar a guardar as compras e até mesmo pequenas atividades externas como ir ao banco.
Guarde em casa somente o que tiver utilidade. No momento do descarte, é essencial perceber as condições do objeto. Ele poderá ser reciclado ou até mesmo doado. “Frequentemente, aquilo que está em bom estado e não nos será útil poderá ser aproveitado por outras pessoas e dá à criança a oportunidade de ser caridosa e se sentir útil”, opina a personal organizer.
Fugindo do consumismo
Quando for adquirir algum artigo, questione sempre a necessidade de ter ou não o objeto. Identifique sua real importância e desenvolva critérios para avaliar cada item, a fim de evitar que a criança sofra insegurança diante das mudanças ou se torne consumista.
“Os excessos devem ser trabalhados com a educação, mas não se esqueça de que a vivência pessoal é intransferível e, acima da organização dos objetos físicos, é preciso organizar nosso emocional, pois o consumo desenfreado incentivado pelas redes sociais nos leva à acumulação compulsiva, que é um comportamento defensivo diante de ameaças imagináveis. Preserve a infância em sua essência. Aprecie as pequenas conquistas da criança e a ensine o valor das coisas não materiais. Os valores não podem ser distorcidos. Cabe aos pais dar amor, limites e regras”, diz Caroline.
A escritora Isa Colli aborda esse tema no livro infantil “O Aniversário de Margarida”. Na festinha de cinco anos da menina, seus antigos brinquedos, que estavam esquecidos dentro do armário, foram convidados para a comemoração. E depois, a menina deu a cada amiguinho um dos seus brinquedos. “A ideia é mostrar que um brinquedo que você não usa mais pode fazer outra criança feliz. A história ensina a importância da doação e da solidariedade”, diz a autora.
Acumular objetos pode ser tentativa de preencher vazios existenciais
A psicóloga clínica Adriana Cavalcante destaca que quem tem o costume de guardar objetos não é necessariamente um acumulador. A pessoa que tem compulsão é motivada por fatores psicológicos. “Quem sofre para desapegar de objetos normalmente sente um vazio muito grande em sua vida. Ela sente-se sozinha e com uma forte tendência ao isolamento e à depressão. E vê no acúmulo de objetos, na maioria das vezes de forma inconsciente, uma saída para preencher vazios existenciais. Acumular coisas deixa essa pessoa normalmente com uma sensação de preenchimento de lacunas, como se o objeto acumulado pudesse lhe render um alívio de suas ansiedades. Na verdade, há um sofrimento por trás dessa pessoa que acumula e não desapega de roupas e outros objetos”, diz.
Quando é preciso buscar ajuda
Ela ressalta que alguns pacientes precisarão de ajuda médica e psicólogica: “junto ao profissional, o paciente que acumula pode ver em sua história de vida o que o levou a ter esse comportamento e o porquê da dificuldade em se desfazer de objetos. Nunca será uma única causa que leva o indivíduo a ser um acumulador e ter dificuldade em desapegar. Na grande maioria das vezes são múltiplos fatores que iniciaram na infância. O fundamental é que o paciente queira se tratar com um profissional”.
Adriana destaca que não adianta a família, amigos ou profissionais cobrarem essa mudança em quem acumula ou não doa objetos. Esse desejo tem que partir do paciente. E aí, no decorrer do tratamento, ele poderá ver formas de dar novos sentidos e significados à sua vida que não sejam apenas comprando e acumulando, com dificuldade em desapegar de objetos. “Não é fácil mudar hábitos e atitudes, mas é possível. O item fundamental para esse tratamento é o desejo do paciente em querer mudar. Sem isso, não será possível nenhuma transformação na vida dessa pessoa”, conclui a psicóloga.