Como já mostramos em uma reportagem especial em nosso site (leia aqui), a leitura pode ser uma ótima opção de entretenimento, não apenas para a garotada como para as pessoas mais velhas. No entanto, se o adulto não está ambientado ao mundo da literatura, existem estratégias para fazer essa aproximação de maneira bem sucedida. Se você é professora ou professor, as dicas que vamos compartilhar aqui podem ser valiosas para aplicação em sala de aula.
Adriana Querido, que é mestra em Educação Básica e professora da rede pública, conta algumas iniciativas que deram certo na Educação de Jovens e Adultos (EJA).
“Diante de um mundo tão tecnológico e com cada vez mais usuários das redes em horas dedicadas aos aparelhos eletrônicos, falar de leitura se torna crucial, seja com crianças ou jovens e adultos. Nesse cenário do século XXI, atribuir sentido à escola, ao ensino e à aprendizagem dos estudantes parece um desafio constante para nós, educadores e educadoras. Quando tratamos de jovens e adultos, esse desafio se torna ainda maior, pois esta modalidade destina-se a uma população que, por inúmeras razões não concluiu o ensino básico em seu tempo. Observamos que a maior parte dos estudantes não possui interesse na leitura e nunca leu um livro completo. Buscamos despertar o interesse pela literatura e convidá-los a compreenderem e refletirem sobre os textos lidos na abordagem dos movimentos literários, que embora façam parte do currículo, parecem distantes do cotidiano dos alunos”, explica a especialista.
Para Adriana, é fundamental para o desenvolvimento de atividades de leitura:
- Compreender que o aluno jovem/adulto vive e produz na sociedade;
- Possui um repertório anterior à escola;
- Na maioria das vezes, trabalha e vai direto para a escola;
- Sente-se cansado e, por vezes, desanimado diante de inúmeras reprovações acumuladas ao longo dos anos;
- Possui uma identidade, autonomia e quer ainda mais se consolidar ou se inserir no mercado de trabalho e na vida plena como cidadão.
Com esse panorama, o uso de textos variados e multimodais na escola revela-se muito eficaz, traz motivação para os estudantes que passam a entender a literatura de uma forma agradável e engajada em questões sociais que os afetam como adultos.
Possibilidades para o desenvolvimento da leitura em turmas de jovens a adultos:
- Conhecer o público com o qual se trabalha, ouvir as suas histórias de vida e falar um pouco da sua como professor ou professora, pois essa atitude simples, cria elos e fortalece a ideia de que somos pessoas interessadas que ampliem os seus conhecimentos e possam desfrutar de todos os seus direitos na sociedade;
- Levá-los a entender um pouco sobre a EJA/ NEJA (na Rede Estadual de Ensino), suas conquistas e direitos;
- Reconhecer e valorizar o protagonismo do aluno adulto;
- Ressignificar a aprendizagem nas aulas fortalecendo a cidadania, pois já viram muitas ações na escola ao longo de suas vidas e precisam de um novo olhar sobre a leitura e a literatura, a fim de que veja finalidade e importância social não apenas como uma atividade escolar com fim em si mesma;
- Desenvolver uma compreensão a respeito da Educação de Jovens e adultos, sua importância no cenário educacional estimulando a reflexão sobre problemas e dilemas relacionados a esta modalidade de ensino para que não abandonem ou evadam.
Mais algumas possibilidades que, aliadas às anteriores, corroboram para um ensino que corresponda ao anseio desses estudantes que já passaram por tantas dificuldades e desafios ao longo de suas vidas:
- Criar, em sala de aula um ambiente de aprendizagem prazeroso e colaborativo;
- Dispor livros, revistas, materiais de leitura e apoio para o grupo com o qual se trabalha;
- Organizar os combinados para as atividades de leitura e a sua importância nas lutas sociais dos jovens e adultos;
- Selecionar obras de conteúdos que sejam do interesse dos alunos, relacionadas à vida adulta, desigualdades, questões sociais, econômicas, culturais, humorísticas e de amor (contos e crônicas são muito bem-vindos);
- Roda de conversas, acompanhada de apresentação com livros para que manuseiem e criem “intimidade” com os que lhes fora apresentado.
Observamos que muitos dizem não ter livro em sua casa. Desta forma, verão as obras literárias na escola; - Propor ações de leituras em pequenos grupos, pois muitos se sentem envergonhados inicialmente e precisam de estímulos e confiança no desenvolvimento da leitura e fluência leitora;
- Os textos multimodais são muito importantes nesse processo e fomentam o interesse dos alunos que estão distantes da escola há vários anos ou dos jovens que pretendem corrigir a distorção da idade em relação ao ano de escolaridade.
Adriana Querido acrescenta que são inúmeras as possibilidades de trabalho e o ensino destes jovens e adultos não pode se encerrar nos bancos escolares. “Então, que tal propor a criação da paródia de uma música conhecida, a resenha de um livro ou a construção de uma história em quadrinhos a partir de um conto de Machado de Assis? Eu fiz e deu super certo!”, revela.
Como a profissional colocou em prática essa ação:
Iniciaram a atividade a partir da apresentação de uma História em Quadrinhos com personalidades afrodescendentes que se destacaram em suas áreas de atuação, incluindo Machado de Assis.
Em seguida, as turmas assistiram a obra ‘O Alienista’, ouviram a leitura do livro feita em capítulos pela professora, pesquisaram o resumo e, desta forma, puderam comparar as variadas linguagens do mesmo título.
Posteriormente, foram selecionados alguns contos do mesmo autor e foi lançada a proposta de criação da HQ.
Para início dos trabalhos os contos foram lidos e discutidos com toda a turma, onde os alunos revelavam suas opiniões e questionamentos ao longo das leituras.
Durante as aulas seguintes, os alunos destinaram mais um tempo para leitura (em grupos) dos contos, como proposto anteriormente. Esta foi mais uma etapa antes das produções dos quadrinhos.
Com a orientação e auxílio da professora, as turmas foram divididas em pequenos grupos e receberam apoio durante a atividade desde o início até a etapa final para exposição.
“Eles amam fazer e ver os seus trabalhos sendo valorizados e admirados pela própria turma e toda a escola”, declarou Adriana.